quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Ausência

Ausência
Vinicius De Moraes

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar seus olhos que são doces... 
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres exausto...
No entanto a tua presença é qualquer coisa, como a luz e a vida... 
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto... 
E em minha voz, a tua voz... 
Não te quero ter, pois em meu ser tudo estaria terminado... 
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados... 
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada... 
Que ficou em minha carne como uma nódoa do passado... 
Eu deixarei... 
Tu irás e encostarás tua face em outra face... 
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada... 
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu... 
Porque eu fui o grande íntimo da noite... 
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa... 
Porque os meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço... 
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado... 
E eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos... 
Mas eu te possuirei mais que ninguém, porque poderei partir... 
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas,serão a tua voz presente, tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Nenhum comentário: