Cancioneiro reúne os poemas líricos que o poeta Fernando Pessoa - autor de alguns dos mais belos versos da língua portuguesa - assinou com o próprio nome.
Os poemas que seguem nesta postagem são parte integrante da obra Cancioneiro, publicada pela L&PM Pocket em 2007.
"Leva-me longe, meu suspiro fundo,
Além d que deseja e que cmeça,
Lá muit longe, onde o viver se esqueça
Das formas metafisicas do mundo.
Aí que o meu sentir vago e profundo
O seu lugar exterior conheça,
Aí durma em fim, aí enfim faleça
O cintilar do espírito fecundo.
Aí... mas de que serve imaginar
Regiões onde sonho é verdadeiro
Ou terras para o ser atormentar?
É elevar demais a aspiração,
E, falhando esse sonho derradeiro,
Encontrar mais vazio o coração."
MAR. MANHÃ
"Suavemente grande avança
Cheia de sol a onda do mar;
Pausadamente se balança,
E desce como a descansar.
Tão lenta e longa que parece
De uma criança de Titã
O glauco seio que adormece,
Arfando à brisa da manhã.
Parece ser um ente apenas
Este correr da onda do mar,
Como uma cobra que em serenas
Dobras se alongue a colear.
Unido e vasto e interminável
No são sossego azul do sol,
Arfa com um mover-se estável
O oceano ébrio de arrebol.
E a minha sensação e nula,
Quer de prazer, quer de pensar...
Ébria de alheia a mim ondula
Na onda lúcida do mar."
(16/11/1909)
Titã - cada um dos gigantes que, segundo a mitologia, quiseram escalar o céu e destronar Júpiter;
Glauco - verde-mar;
Arrebol - vermelhidão da aurora ou do sol-posto.
"Quem bate à minha porta
Tão insistentemente
Saberá que está morta
A alma que em mim sente?
Saberá que eu a velo
Desde que a noite é entrada
Com o vácuo e vão desvelo
De quem não vela nada?
Saberá que estou surdo?
Por que o sabe ou não sabe,
E assim bate, ermo e absurdo,
Até que o mundo acabe?"
(23/05/1932)
"Cansa sentir quand se pensa.
No ar da noite a madrugar
Há uma solidão imensa
Que tem por corpo o frio do ar.
Neste momento insone e triste
Em que não sei quem hei-de ser,
Pesa-me o informe real que existe
Na noite antes de amanhecer.
Tudo isto me parece tudo.
E é uma noite a ter um fim
Um negro astral silêncio surdo
E não poder viver assim.
(Tudo isto me parece tudo.
Mas noite, frio, negror sem fim,
Mundo mudo, silêncio mudo -
Ah, nada é isto, nada é assim!)"
(09/11/1932)
2 comentários:
Fernando Pessoa é um ícone da poesia mundial. Ele e seus heterônimos.
Um poema que eu gosto muito é o seguinte:
“Não deixe que a saudade sufoque,
que a rotina acomode,
que o medo impeça de tentar.
Desconfie do destino e
acredite em você.
Gaste mais horas realizando que sonhando,
fazendo que planejando,
vivendo que esperando
Porque, embora quem quase morre esteja vivo,
quem quase vive já morreu.”
(Fernando Pessoa)
Parabéns pelo blog!
CAMILA
Camila, muito obrigada pela visita e comentário.
Também gosto muito deste poema.
Volte sempre!
Jú
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